6 Maio 2014

O Secretário-Geral da Amnistia Internacional (AI) considera que a “saída limpa” de Portugal do programa de assistência financeira constituiu simultaneamente uma “saída muito dolorosa para muita gente” e por isso pediu ao Governo português que avalie as consequências da austeridade sobre os direitos humanos.

Recebido em São Bento pelo Primeiro-Ministro, Salil Shetty reconheceu que todos entenderão a situação de dificuldade económica do país mas invocou a lei internacional para lembrar que, antes de decretar medidas desta natureza, cabe aos governos fazerem uma avaliação adequada dos impactos das medidas em todos os grupos, sobretudo os mais vulneráveis. Para a AI, essa avaliação não foi feita em Portugal de forma sistemática, tendo os idosos, as crianças, as mulheres e a comunidade “roma” sofrido um impacto desproporcionado.

Shetty recomendou por isso ao Primeiro-Ministro português a criação de um mecanismo nacional de monitorização do impacto das medidas de combate à crise económica nos direitos humanos, proposta que colheu abertura por parte do Executivo. Ainda invocando a lei internacional, Shetty defendeu que as medidas de austeridade têm de ser temporárias e não permanentes: “Se dizemos que há uma crise, as medidas têm de ter um prazo e o Governo tem de ser transparente e responsável por garantir que estas políticas mudam”.

Papel mais ativo na Europa e em África

A poucas semanas das eleições europeias, e numa conferência sobre “O Futuro dos direitos humanos na Europa” na Faculdade de Direito de Lisboa, o responsável da AI referiu ainda que Portugal deve ter um papel mais ativo na defesa dos direitos humanos a nível europeu, por exemplo, no que toca aos refugiados.  

O Secretário-Geral da Amnistia Internacional disse ainda que Portugal mantém um “silêncio ensurdecedor” sobre a situação dos direitos humanos em países como Angola ou a Guiné Equatorial e que tal não deve ser condicionado por questões económicas.

Questionado pelos jornalistas sobre a candidatura de Portugal a um lugar no Conselho de Direitos Humanos da ONU, Shetty disse ter uma “visão mista”: por um lado, lembrou que Portugal já ratificou muitas das mais importantes convenções internacionais, como o protocolo opcional sobre os direitos económicos, sociais e culturais, e tem feito “um trabalho muito progressista” na convenção europeia da violência doméstica e violência contra as mulheres, incluindo pelo atual Governo. Por outro lado, Salil Shetty entende que “muitas questões ainda ficam no papel e na prática ainda há muitas lacunas”. O grande desafio para Portugal é justamente reconciliar “o que se diz com o que se pratica”. 

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