- Em 6 de março de 2025, homens armados leais ao antigo governo de Assad lançaram um ataque contra as forças de segurança do Estado sírio em Latakia
- Autoridades da Síria “têm de agir rapidamente para garantir a proteção dos civis nos combates em curso ou futuros e para evitar mais mortes ilícitas e outras violações” — Heba Morayef
- As imagens que chegam da Síria “são uma lembrança sinistra dos ciclos passados de atrocidades que os sírios sofreram e correm o risco de inflamar as tensões sectárias e alimentar mais violência mortal” — Heba Morayef
As autoridades da Síria “têm de agir rapidamente para garantir a proteção dos civis nos combates em curso ou futuros e para evitar mais mortes ilícitas e outras violações”, afirmou a diretora regional da Amnistia Internacional, Heba Morayef, em resposta às notícias de que centenas de civis, na sua maioria da minoria alauita, foram mortos nas zonas costeiras do país.
“A incapacidade de atuar de forma decisiva e de conduzir investigações independentes, imparciais e eficazes, bem como de garantir que os autores dos crimes sejam levados à justiça, apenas encorajará aqueles que acreditam poder matar impunemente”, apontou Heba Morayef.
Segundo a responsável da Amnistia Internacional, “para além das suas obrigações ao abrigo do direito humanitário internacional, o governo da Síria tem a obrigação de defender os direitos humanos de todos os que vivem na Síria. As autoridades devem tomar medidas claras para defender rigorosamente a igualdade de direitos de todos os sírios, nomeadamente assegurando que nenhuma pessoa ou grupo seja alvo de ataques com base numa alegada filiação política”.
“Os sírios merecem um futuro assente na justiça e na dignidade, mas, mais uma vez, as comunidades estão a ser forçadas a suportar perdas inimagináveis”
Heba Morayef
Heba Morayef sublinhou que “as imagens horríveis que emergem da costa da Síria, com corpos estendidos nas ruas e famílias em luto pelos seus entes queridos, são uma lembrança sinistra dos ciclos passados de atrocidades que os sírios sofreram e correm o risco de inflamar as tensões sectárias e alimentar mais violência mortal”. E acrescentou: “Os sírios merecem um futuro assente na justiça e na dignidade, mas, mais uma vez, as comunidades estão a ser forçadas a suportar perdas inimagináveis”.
“Embora o governo tenha anunciado a criação de uma comissão independente de apuramento de factos e de investigação e se tenha comprometido a remeter os responsáveis pelos crimes para a justiça, é fundamental que este processo seja totalmente transparente e conduzido de acordo com as normas internacionais. A comissão foi incumbida de apresentar um relatório à Presidência no prazo de 30 dias, mas estas conclusões devem também ser tornadas públicas. Sem abertura, as vítimas e o público em geral não terão motivos para confiar que as investigações foram conduzidas de forma credível e cuidadosa”, afirmou a diretora regional da Amnistia Internacional.
A promessa do Presidente Ahmad al-Sharaa de responsabilizar os autores de crimes “com toda a firmeza e sem clemência” não terá, segundo Heba Morayef, “grande significado se a justiça não for feita de uma forma que dê prioridade à participação das vítimas, defenda os direitos das pessoas e seja feita de forma imparcial, independentemente de quem seja o responsável”.
“Autoridades devem permitir que investigadores independentes tenham acesso à Síria, incluindo às zonas costeiras do país, para que possam realizar o seu próprio trabalho de apuramento dos factos”
Heba Morayef
“Para além da investigação conduzida pelo governo, as autoridades devem permitir que investigadores nacionais e internacionais independentes tenham acesso à Síria, incluindo às zonas costeiras do país, para que possam realizar o seu próprio trabalho de apuramento dos factos”, acrescentou a responsável para o Médio Oriente.
“Estes acontecimentos horríveis sublinham mais uma vez a necessidade urgente de as autoridades sírias tomarem medidas abrangentes para garantir a verdade, a justiça e a reparação de todas as vítimas de violações graves na Síria. Em última análise, a verdade, a justiça e a reparação destinam-se a remediar os danos causados às vítimas e a garantir que ‘nunca mais’ signifique realmente ‘nunca mais’”, concluiu Heba Morayef.
Contexto
A família Assad, que governou a Síria durante décadas, pertence à minoria alauita. Em novembro de 2024, o Hay’at Tahrir al- Sham (HTS) e os grupos armados da oposição aliados lançaram uma ofensiva militar que levou à tomada da província de Alepo. Em 8 de dezembro, os grupos armados da oposição capturaram Damasco e o Presidente Bashar al-Assad fugiu do país.
Em 8 de dezembro de 2024, os grupos armados da oposição capturaram Damasco e o Presidente Bashar al-Assad fugiu do país
Em 29 de janeiro de 2025, o Comando das Operações Militares da Síria nomeou o antigo chefe do HTS, Ahmad al-Sharaa, como chefe de Estado durante o período de transição. Nesse mesmo dia, as autoridades de transição anunciaram que todas as fações militares seriam dissolvidas e integradas nas instituições do Estado.
Em 6 de março de 2025, homens armados leais ao antigo governo de Assad lançaram um ataque contra as forças de segurança do Estado sírio em Latakia. Em resposta, as autoridades sírias, apoiadas por milícias pró-governamentais, contra-atacaram.
De acordo com fontes locais, a escalada de ataques deu origem a uma série de ataques em várias províncias. Até 10 de março, o Observatório Sírio dos Direitos Humanos informou que mais de 973 civis, a maioria dos quais alauitas, tinham sido mortos.
O direito internacional humanitário aplica-se a todas as partes beligerantes envolvidas no conflito na Síria. O governo sírio, atualmente chefiado por Ahmad al-Sharaa, tem também obrigações no âmbito do direito internacional dos direitos humanos para com todas as pessoas que vivem na Síria.