20 Novembro 2012

O Comité da ONU contra a tortura publicou, no dia 19 de novembro, o Comentário Geral nº3 examinando as obrigações dos Estados partes da Convenção contra a tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes para, de acordo com o artigo 14, providenciar reparação efetiva.

A Amnistia Internacional saúda a adoção desta referência interpretativa do artigo 14, que irá orientar a implementação da Convenção nos Estados, encorajando-os, assim como às organizações internacionais, às organizações não-governamentais, às vítimas e aos seus representantes, a usarem este comentário geral como ferramenta no trabalho de assegurar a reparação às vítimas de tortura.

O comentário servirá como instrumento de pressão junto dos Estados parte para implementarem as suas obrigações e respeitarem os padrões de avaliação dos relatórios nacionais apresentados ao Comité e das comunicações individuais estabelecidas.

Os relatórios do Comité e as queixas individuais tornaram evidente que os Estados parte da Convenção têm falhado recorrentemente na reparação às vítimas, o que tem consequências devastadoras.

Se não tiverem acesso a reabilitação física rápida e efetiva as vítimas podem experienciar dor crónica e debilitante e fraca saúde. Psicologicamente, a falta de apoio adequado pode levar ao desenvolvimento de traumas e perturbações mentais duradouras, não só nas vítimas mas também nos seus familiares. Se a gravidade da prática a que foram sujeitas não for reconhecida a reinserção na sociedade será comprometida e a discriminação persistirá. Se não receberem garantias em como não serão sujeitos à mesma forma de tratamento ou punição poderão viver numa situação de medo constante. O comentário geral é um passo importante para acabar com estas tendências perturbadoras a que as vitimas estão sujeitas.

O Comentário reconhece o impacto transformativo da reparação nas “relações sociais que podem ser as causas subjacentes” da mesma, reconhecendo especialmente a importância das questões de género.
Os princípios básicos que os Estados parte devem aplicar na implementação das suas obrigações, segundo o artigo 14, são os seguintes:

– Confirmar a igualdade de acesso das vítimas a reparações, sem limitações;

– Enfatizar a importância da participação da vítima no processo de reparação;

– Afirmar que “o termo ‘vítima’ inclui a família ou dependentes afetados, tal como pessoas que sofreram por terem ajudado as vítimas ou prevenido a vitimização’’;

– Reconhecer que a reparação deve ser adequada, efetiva e abrangente, incluindo restituição, compensação, reabilitação, satisfação e garantias de não-repetição;

– Reconhecer o impacto que a discriminação pode ter na capacidade da vítima de procurar e obter a reparação adequada;

– Realçar as conexões entre as causas estruturais das violações;

– Apontar a responsabilidade do Estado na reparação às vítimas;

– Afirma que “a aplicação do artigo 14 não se limita a vitimas torturadas no território do Estado parte ou por ou contra os nacionais do mesmo” mas também apreciará “os esforços dos Estados parte para providenciar reparações civis a vitimas sujeitas a tortura ou maus-tratos fora do seu território”;

– Declarar que os Estados parte “devem tomar medidas para prevenir a interferência na privacidade das vítimas e para assegurar a sua proteção”;

– Apontar as obrigações processuais que devem ser promulgadas na legislação;

– Explicar que a existência de amnistias para tortura e maus-tratos perpetuam um sentimento de impunidade e devem ser totalmente removidas por estarem em “direto conflito com a obrigação de providenciar reparo às vítimas”;

– “Afirmar que o argumento da segurança nacional não deve ser usado em nenhuma circunstância para recusar reparação”;

– Apelar aos Estados parte que reconheçam a competência do Comité para considerar queixas individuais, segundo o artigo 22, permitindo às vítimas submeter comunicações e procurar o parecer do Comité, e que ratifiquem ou adiram ao Protocolo Opcional da Convenção contra a tortura;

– Apontar informação detalhada que deve ser incluída nos relatórios apresentados ao Comité.

A Amnistia Internacional apela a todos os Estados parte da Convenção que implementem na totalidade as medidas apontadas pelo comentário geral.

Contexto

A discussão no seio do Comité sobre o comentário geral à implementação do artigo 14 foi iniciada há três anos. Em junho de 2011, o Comité iniciou um processo de consulta online através do qual recebeu comentários provenientes dos Estados parte e de organizações não-governamentais, incluindo a Amnistia Internacional. O Comité levou também a cabo uma reunião com as partes interessadas em novembro de 2011.

O texto completo do Comentário Geral nº3 pode ser encontrado aqui.

O Artigo 14 da Convenção afirma:

1.    Cada Estado parte deve assegurar no seu sistema legal que a vítima de um ato de tortura terá direito a obter reparação e a uma compensação adequada e justa, incluindo os meios para a reabilitação completa, quando possível. Em caso de morte da vitima como consequência do ato de tortura, os seus dependentes devem ter direito à compensação.

2.    Nada neste artigo deve afetar qualquer direito da vítima ou outras pessoas à compensação existente no quadro legal nacional.

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