21 Novembro 2013

A restritiva legislação adotada na Rússia há um ano que força a esmagadora maioria das organizações não-governamentais no país a registarem-se como “agentes estrangeiros” está a estrangular o trabalho destas organizações independentes, denuncia a Amnistia Internacional.

O diretor da Amnistia Internacional para a Europa e Ásia Central, John Dalhuisen, sublinha que “desde que entrou em vigor há um ano, a lei dos agentes estrangeiros tem um tido um registo muito negativo”. Mais de mil organizações não-governamentais (ONG) foram averiguadas e dezenas receberam notificações por parte das autoridades. Muitos dos mais importantes grupos de defesa dos direitos humanos foram multados e alguns forçados a fechar.

Esta lei está no “olho do furacão” de uma vaga legislativa repressiva que vem sendo adotada desde o regresso de Vladimir Putin à presidência da Federação Russa, em maio de 2012.

Tendo entrado em vigor a 21 de novembro do ano passado, aquela lei exige que qualquer organização não-governamental que receba fundos estrangeiros e mantenha uma “atividade política” – conceito muito vagamente definido na lei – se registe obrigatoriamente como uma “organização que desenvolve funções de agente estrangeiro”.

E tem vindo a afetar de forma ampla ONG que trabalham nas áreas dos direitos sociais e políticos, económicos e cívicos, assim como questões ambientais e de discriminação, incluindo os direitos LGBTI (comunidade lésbica, gay, bissexual, transgénero e intersexual). “A lei dos agentes estrangeiros foi criada para ostracizar e desacreditar as ONG que trabalham na defesa dos direitos humanos, na monitorização de eleições e outras áreas cruciais. O que esta lei está a fazer é a dar um pretexto perfeito para as autoridades multarem e forçarem o encerramento de organizações essenciais, e irá seguramente cortar-lhes o acesso a fontes vitais de financiamento”, aponta John Dalhuisen.

As ONG russas têm ao longo deste último ano deixado claro – e publicamente – que se recusam a serem classificadas como “agentes estrangeiros”. As “inspeções” massivas feitas pelas autoridades de mais de mil destas organizações na Primavera e Outono de 2013, sem qualquer anúncio prévio, foram depois largamente publicitadas pelos media russos ligados ao regime de Putin, assim como os processos consequentemente abertos contra várias ONG e contra os seus líderes. Os processos administrativos e os julgamentos sucederam-se, e mais ainda são esperados.

Multas, suspensões e o quase inevitável fecho

Uma das mais importantes organizações russas de monitorização de eleições, a Golos (Voz, em russo) acabou por decidir extinguir-se depois de as autoridades terem usado a “lei dos agentes estrangeiros” para condenar o grupo a pagar pesadas multas e forçar à suspensão das suas atividades durante vários meses. A Golos tentou recorrer desta decisão em tribunal, mas até agora sem qualquer sucesso.

O mesmo destino foi partilhado pelo centro Kostroma de Apoio às Atividades Públicas: a organização fechou atividade por não ter meios para pagar a elevada multa que lhe foi aplicada. E o festival de cinema temático LGBTI Bok o Bok (Lado a lado, em russo) pagou por ser lado a multa e depois encerrou – deixara mesmo de existir oficialmente quando finalmente venceu o recurso em tribunal e já não podia então reclamar a devolução do dinheiro pago.

Esta semana apenas, cinco ONG de Moscovo – a Memorial, a Veredito Público, o movimento Pelos Direitos Humanos, a Jurix e a Golos – estiveram em tribunal a tentar suster a pressão exercida sobre elas pelas autoridades ao abrigo da chamada “lei dos agentes estrangeiros”. As audiências em tribunal destes casos acabaram por ser adiadas. Muitas outras organizações passaram pelos tribunais desde abril e todas pelas mesmas razões.

Pelo menos 37 ONG foram oficialmente notificadas ao longo deste último ano de que se encontram em violação da lei caso persistam em receber financiamentos oriundos de outros países e a participarem nas atividades que a legislação arbitrariamente define como “políticas” – isto inclui a publicação na internet de conteúdos sobre direitos humanos na Rússia, assim como a recusa em registarem-se oficialmente como “agentes estrangeiros”

Com a aproximação dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2014, que se realizam na cidade russa de Sotchi, apoiantes e membros da Amnistia Internacional de todo o mundo estão envolvidos numa campanha global para chamar à atenção para o deplorável currículo da Rússia no que toca aos direitos humanos – e tentar assim exercer pressão para que se assista a uma mudança de atitude por parte do regime de Vladimir Putin. A Amnistia Portugal está também envolvida nesta campanha mundial.

Artigos Relacionados