15 Abril 2010

Num relatório divulgado hoje, a Amnistia Internacional alerta para o deficiente apoio judiciário que as mulheres vítimas de violência doméstica e sexual enfrentam no Uganda, apelando para o suprimento das barreiras de acesso à justiça.

O relatório, “I Can’t Afford Justice – Violence against women in Uganda, documenta os obstáculos económicos e sociais do acesso à justiça, incluindo os custos de investigação criminal e os casos de discriminação praticados pelas autoridades. 

As vítimas deparam-se com uma fraca capacidade de resposta das autoridades policiais e são obrigadas a suportar as custas de transporte dos agentes para a apreensão dos suspeitos. Para além disso, são forçadas a pagar taxas de investigação forense e outros custos procedimentais. 

As autoridades encaram estes casos de violência sexual com uma postura geral de recriminação para com as próprias vítimas, como se a violência de que são sujeitas fosse culpa sua. E isto passa-se num país onde os valores promovidos pelo governo dão primazia à “unidade da estrutura familiar” em detrimento da justiça para com as vítimas de violência. 

“O fracasso do governo na protecção e apoio às vítimas de violência sexual é um descrédito para o sistema judicial,” denota Widney Brown, Directora Sénior da Amnistia Internacional. “A falta de recursos governamentais e de vontade política equivale a uma situação de impunidade dos agressores. As mulheres do Uganda já perderam a confiança no sistema judicial.” 

A violência contra raparigas e mulheres no Uganda continua generalizada. Dois terços das mulheres vítimas de violência doméstica identificam o parceiro como o seu agressor, enquanto uma em quatro mulheres revela que a sua primeira experiência sexual foi forçada. 

O relatório documenta vários testemunhos pessoais que revelam como a polícia, o Ministério Público e os tribunais não dispõem de financiamento e funcionários adequados à realização das suas atribuições. Estas deficientes infra-estruturas revelam-se obstáculos para o acesso à justiça, já que o sistema criminal não consegue providenciar serviços de apoio às vítimas. 

“Quando fui à polícia, pediram-me dinheiro para combustível, de que não disponho. O meu marido bateu-me novamente, mas já desisti de recorrer à polícia, porque me pedem sempre dinheiro que não tenho,” refere uma das vítimas à Amnistia Internacional. 

Não existe nenhum abrigo público para as vítimas de crimes de violência de género. As mulheres também são afastadas dos abrigos geridos pelas instituições de caridade, por falta de espaço e as instituições de ajuda estão saturadas de casos de violência de género. Muitas mulheres suportam maus tratos simplesmente porque não têm nenhum outro sítio para ir. 

As atitudes oficiais acabam por impor às mulheres a necessidade de aceitarem mediação e apesar do perigo constante manterem uma relação violenta, simplesmente por não terem nenhuma outra forma viável de se sustentarem a si ou aos seus filhos. Consequentemente, muitas mulheres são despojadas do direito de viver sem serem vítimas de violência e perdem a igualdade de protecção perante a lei. 

Mesmo que a polícia tome em consideração a denúncia, existem poucos mecanismos legais de apoio. As autoridades de um centro de acolhimento para mulheres revelaram à Amnistia Internacional o caso de uma rapariga de 13 anos que denunciou anos de violência sexual a que foi submetida pelo seu próprio pai, mas agora é sujeita a ameaças dos seus familiares e teme pela sua segurança. O funcionário que acompanha o seu processo afirma que ela não se encontra em segurança no sítio onde está. 

O relatório, para além de expor a necessidade de uma melhor gestão de recursos governamentais de forma a reforçar o sistema criminal e garantir que os criminosos sejam trazidos à justiça, revela ainda que o governo não toma medidas básicas que garantam a defesa das mulheres. 

Por exemplo, não existe qualquer regra de confidencialidade relativa à vítima, cuja denúncia é lavrada num gabinete público, apesar de ser obrigada a revelar os detalhes íntimos da violência a que é sujeita. 

Muitas mulheres questionadas pela Amnistia Internacional disseram terem sido sujeitas a perguntas humilhantes acerca das suas vidas privadas e prévia conduta sexual prévia por agentes policiais e advogados sem formação adequada para o assunto. 

O governo do Uganda está igualmente a desrespeitar a sua obrigação internacional de garantir o acesso à justiça por parte das mulheres. Por conseguinte, é garantida aos criminosos a sua situação de impunidade. 

“O governo do Uganda necessita de rever a sua legislação, política e práticas de forma a eliminar o enorme fosso que separa a sua retórica de protecção dos direitos das mulheres e o falhanço total da sua efectiva concretização” afirma Widney Brown. 

A Amnistia Internacional exige que o governo tome medidas imediatas no sentido de proporcionar às mulheres vítimas de violência condições adequadas de acolhimento, serviços de saúde e apoio legal. Para além disso, deverá tomar medidas preventivas de violência, lidando com as suas causas de fundo, eliminando atitudes discriminatórias e obstáculos enfrentados pelas mulheres no acesso à justiça.  

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