15 Dezembro 2014

As autoridades sul-coreanas têm de suspender imediatamente o planeado envio de uma grande quantidade de gás lacrimogéneo para a Turquia, onde as forças de segurança têm recorrido frequentemente a equipamento antimotim para reprimir manifestações pacíficas, alerta a Amnistia Internacional.

A organização de direitos humanos recebeu informação credível de que a Coreia do Sul tem planeado exportar para a Turquia quase 1.9 milhões de cartuchos de gás lacrimogéneo e granadas de gás produzidas naquele país. A primeira remessa de equipamento antimotim deverá ser enviada por uma empresa sul-coreana para o Governo turco em meados de janeiro de 2015.

“Todos os envios de gás lacrimogéneo e outro equipamento de controlo de motins para a Turquia têm de ser suspensos imediatamente, sob o risco de irem alimentar ainda mais repressão e abusos”, frisa o chefe do gabinete de Segurança, Forças Armadas e Polícias da Amnistia Internacional, Marek Marczynski. “As autoridades sul-coreanas têm de enviar uma mensagem clara e urgente de que nenhumas armas serão fornecidas a um país onde é usada força abusiva e arbitrária contra manifestantes. E o falhanço total do Governo turco em assegurar o direito a manifestação pacífica desrespeita por completo os padrões internacionais no que toca a policiamento e a direitos humanos”, prossegue.

O perito da organização de direitos humanos lembra ainda que “a Turquia tem um registo deplorável de recurso abusivo ao gás lacrimogéneo durante protestos, disparando com frequência cartuchos diretamente contra os manifestantes”. “Nenhum Governo responsável deve alimentar abusos cometidos a esta escala”, defende Marek Marczynski.

Segundo as informações recolhidas pela Amnistia Internacional, o fornecimento da Coreia do Sul à Turquia inclui 1.898.515 cartuchos de químicos “menos letais”, entre os quais cartuchos de quatro tamanhos diferentes de gás lacrimogéneo, no total de 1.509.015, e 389.500 granadas de gás. O primeiro fornecimento de cerca de 550 mil cartuchos está agendado para meados de janeiro próximo, com o restante planeado para envio em meados de maio seguinte.

O tipo e quantidades do equipamento em causa são consistentes com o que as forças de segurança turcas usaram para dispersar as manifestações no ano passado, e com aquilo que se estima seria necessário para repor os estoques em 2015. O mesmo produtor sul-coreano de armamento já fez antes fornecimentos de equipamento antimotim para a Turquia e também para o Bahrein.

Repressão de manifestações

Entre 28 de maio e meados de julho de 2013, as manifestações que acabaram por ficar designadas como “protestos do Parque Gezi” estenderam-se para lá de Istambul (na foto), até todas menos duas das 81 províncias da Turquia, numa adesão que variou entre algumas centenas de pessoas a dezenas de milhares.

As forças de segurança por toda a Turquia recorreram repetidamente à força abusiva e arbitrária contra manifestantes pacíficos, em algumas ocasiões com consequências fatais. Pelo menos quatro manifestantes morreram em resultado direto do uso excessivo de força por parte da polícia, incluindo Berkin Elvan, de 15 anos, e Abdullah Cömert, de 22, os quais foram atingidos na cabeça por cartuchos de gás lacrimogéneo disparados a muito curta distância. Mais de oito mil pessoas foram feridas, algumas com extrema gravidade, durante a vaga de protestos.

E em 2014, a polícia recorreu a força excessiva também no 1º de maio contra manifestantes pacíficos na praça Taksim, no centro de Istambul.

A Amnistia Internacional documentou, em repetidas ocasiões, como a polícia e forças de segurança turcas usaram gás lacrimogéneo e canhões de água de forma excessiva, arbitrária e injustificável para dispersar manifestantes. Foram registados também disparos com balas de borracha e balas de plástico contra manifestantes desarmados, do que resultou mortos e feridos graves. Milhares mais foram espancados pela polícia e agentes de outras agências das forças de segurança. Manifestantes, ativistas de direitos humanos e jornalistas foram detidos e presos.

“Atualmente nenhum Governo deveria estar a fornecer às autoridades turcas ferramentas que são usadas para reprimir ainda mais manifestações pacíficas. Todos os envios de gás lacrimogéneo e outro equipamento de controlo de motins tem de ser suspenso até que as autoridades turcas avancem uma garantia credível de que tal repressão não se repetirá e assumam claramente o compromisso de levar a cabo investigações zelosas, imparciais e independentes sobre os abusos cometidos pelas forças de segurança”, remata Marek Marczynski.

 

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