3 Setembro 2015

As autoridades na Guiné têm de conter a ação das forças de segurança com a aproximação das eleições presidenciais, em outubro, e garantir que não se repetem os incidentes de recurso a força excessiva em confrontos com manifestantes, alerta a Amnistia Internacional em novo relatório. No início de 2015 pelo menos seis pessoas morreram e mais de 100 ficaram feridas durante protestos.

O novo relatório da organização de direitos humanos – intitulado “Guinea: Preventing the excessive use of force and respecting freedom of peaceful assembly in the 2015 presidential elections and beyond” (Guiné: Prevenção do uso de força excessiva e respeito pela liberdade de reunião pacífica nas eleições presidenciais de 2015 e para além delas) – analisa o que aconteceu nos protestos que ocorreram em abril e maio passados (na foto, manifestantes detidos em Conacri, a capital, em abril). E alerta que, sem uma ação concertada por parte das autoridades do país, podem voltar a registar-se mortes e feridos nas manifestações que vão anteceder o sufrágio de 11 de outubro próximo. A campanha eleitoral arranca um mês antes do voto.

Esta investigação conclui também que é imperativo que seja feita uma reforma legal depois das eleições com o objetivo de prevenir a ocorrência deste tipo de violência no futuro, assim como para facilitar o gozo do direito de reunião pacífica e assegurar a responsabilização em caso de violações destes direitos.

“A morte e ferimentos de manifestantes a que se assistiu no início deste ano e causadas pelas forças de segurança da Guiné, que lançaram mão de uma força arbitrária e excessiva, mostra como é crucial que sejam tomadas medidas para respeitar e proteger os direitos humanos durante o ciclo eleitoral”, frisa o diretor da Amnistia Internacional para a região da África Ocidental e Central, Alioune Tine.

O perito considera que o “desafio para as autoridades, para os candidatos e para as forças de segurança é pôr fim ao ciclo de violência e desconfiança”. “Têm de criar condições para que todos na Guiné se sintam seguros no exercício dos seus direitos de expressão e de reunião pacífica, e para que os cidadãos possam participar com segurança no processo eleitoral”, prossegue.

Provas recolhidas pela Amnistia Internacional atestam que pelo menos seis pessoas foram mortas e mais de cem, incluindo crianças, ficaram feridas nos confrontos com as forças de segurança, cujos agentes, em muitos casos, recorreram à força de forma arbitrária e excessiva. Centenas de manifestantes foram detidos amiúde em circunstâncias que configuram detenções arbitrárias.

A 4 de abril de 2015, um rapazito de quatro anos foi atingido na cabeça com uma carga de gás lacrimogéneo no exterior da sua casa. A carga provocou-lhe graves ferimentos na cabeça e dificuldades respiratórias. A família da criança não apresentou queixa com medo de sofrer represálias.

E a 14 de abril, uma rapariga de 12 anos foi alvejada a tiro no pé esquerdo por agentes das forças de segurança em patrulha quando ela estava sentada num pátio junto a casa.

Thierno Sadou Diallo, de 34 anos, foi morto a 7 de maio pelas forças de segurança da Guiné. “Um grupo de cinco homens com uniforme de gendarmes [soldados de corporações especiais] veio na nossa direção. Um deles tinha uma espingarda e começou a apontá-la contra nós. Ouvimos dois tiros. A primeira bala atingiu a parede ao nosso lado e a segunda atingiu Thierno”, testemunhou um dos amigos de Diallo à Amnistia Internacional. A família deste homem apresentou queixa ao Procurador-geral a 8 de maio, mas até à data ninguém foi acusado em relação à sua morte.

Há também relatos de que as forças de segurança recorreram à força de forma arbitrária contra jornalistas que faziam a cobertura das manifestações. A Amnistia Internacional recolheu testemunhos sobre vários incidentes em que jornalistas foram insultados ou espancados pelas forças de segurança enquanto desempenhavam a sua atividade profissional durante protestos.

“Jornalistas e defensores de direitos humanos têm de ter toda a liberdade para desempenharem o seu trabalho sem interferências injustificadas”, sublinha Alioune Tine.

O diretor da Amnistia Internacional para a região da África Ocidental e Central aponta ainda que “as pessoas que se juntam em manifestações têm de o fazer sentindo-se seguras de que as forças de segurança não só respeitarão e protegerão o seu direito de reunião mas também o seu direito à vida”. “E todas as circunstâncias de recurso arbitrário ou abusivo da força têm de ser investigadas”, remata.

Ao longo dos últimos dez anos a Amnistia Internacional documentou mais de 350 mortes e mais de 1.750 pessoas feridas durante manifestações na Guiné. A maior parte são manifestantes, e em alguns casos transeuntes que não participavam nos protestos, mortos ou feridos pelas forças de segurança.

Aqui se incluem os 135 manifestantes mortos em janeiro e fevereiro de 2007 quando instavam nas ruas ao afastamento do então Presidente Lansana Conté (no poder desde 1984 e até à sua morte em dezembro de 2008), e também as mais de 150 pessoas que foram mortas no massacre que se deu num estádio de Conacri, a 28 de setembro de 2009, quando as forças de segurança abriram fogo contra a multidão de manifestantes da oposição, assim como as nove pessoas mortas durante os protestos que antecederam as eleições legislativas de 2013.

Até à data não se registou responsabilização por estas violações de direitos humanos no país, e, apesar de terem sido encetadas algumas reformas no sector da segurança, continuam a existir sérios riscos de que ocorram mais violações em 2015 – a não ser que sejam tomadas medidas pelas autoridades para facilitar as manifestações pacíficas, para garantir a liberdade de reunião e para prevenir a ocorrência de um uso excessivo da força.

 

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