30 Junho 2016

A Amnistia Internacional reitera as recomendações feitas a Portugal no sentido de ser necessária urgentemente uma investigação completa, efetiva e independente do possível papel do país na utilização do território nacional em conexão com violações de direitos humanos associadas ao programa de “rendições” (detenções e transferências secretas) da CIA.

Este reiterar da tomada de posição pela organização de direitos humanos surge na sequência da apresentação do relatório inicial por parte de Portugal ao Comité sobre Desaparecimentos Forçados das Nações Unidas, devido à ratificação da Convenção Internacional para a Proteção de todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados feita em janeiro de 2014.

Logo em abril desse mesmo ano, a Amnistia Internacional recomendou a Portugal que o país deve assegurar uma investigação aopossível papel das autoridades portuguesas na utilização do território nacional em conexão com violações de direitos humanos associadas ao programa de “rendições” da CIA, ou outras transferências ilegais que tenham sido levadas a cabo, e tornar públicos os resultados dessa mesma investigação.

Em dezembro de 2013 o Comité contra a Tortura das Nações Unidas já tinha encorajado Portugal a continuar as investigações, caso surgisse mais informação, relativamente a alegações do envolvimento do país num programa de “rendições” e da utilização dos aeroportos e do espaço aéreo nacional por voos envolvidos na “rendição extraordinária”, para trazer à luz os factos em torno destas alegações.

O Comité relembrou também Portugal que as transferências e o refoulement de pessoas são, em si mesmos, violações do artigo 3º da Convenção Contra a Tortura, quando há motivos substanciais para acreditar que estas pessoas estejam em risco de ser submetidas a tortura.

Em janeiro de 2015, a Amnistia Internacional publicou um novo relatório, intitulado “Breaking the Conspiracy of Silence: USA’s European Partners in Crime” (Quebrar a conspiração do silêncio: os parceiros de crime europeus dos Estados Unidos), que refere o estudo do Comité Seleto de Serviços Secretos do Senado dos Estados Unidos, centrado exclusivamente em locais de detenção secreta estabelecidos e/ou operados pela CIA, onde agentes e profissionais de saúde contratados pelo Governo dos EUA interrogaram pessoas utilizando as chamadas “técnicas de interrogatório reforçadas” e outros métodos brutais que equivalem a tortura e outros maus-tratos.

Este relatório da Amnistia Internacional refere também que, para além de alguns Estados europeus terem albergado centros de detenção secretos da CIA, onde muitos dos abusos ocorreram, uma série de países europeus estiveram também profundamente envolvidos na rede global de “rendições”, permitindo aos EUA a utilização de espaço aéreo e aeroportos para transferir pessoas detidas ilegalmente pelo mundo, fora do alcance da lei, indicando Portugal como um dos países europeus envolvidos de alguma forma nas operações de “rendição” dos EUA.

A organização de direitos humanos alertou ainda recentemente, a 9 de junho – a propósito da extradição da ex-agente da CIA Sabrina de Sousa de Portugal para Itália, no âmbito do caso da detenção e transferência secreta de Abu Omar – que há muito tempo a Amnistia Internacional insta à responsabilização de quem concebeu e de quem executou o programa de detenções e transferências secretas da CIA. “As vítimas destas operações foram sujeitas a raptos e foram transferidas para países com registos chocantes de tortura e de desaparecimentos forçados; foram forçados a ficar fora do alcance da lei e merecem justiça”, frisou então a perita em antiterrorismo e direitos humanos da Amnistia Internacional, Julia Hall.

“As acusações formuladas e condenações já feitas em Itália de agentes e responsáveis da CIA pelo rapto de Abu Omar abriram novos caminhos na luta pela responsabilização. A ser extraditada para Itália, Sabrina de Sousa deverá responder às acusações que lhe são feitas no sistema de justiça italiano. Em circunstâncias nenhumas deverá ser perdoada liminarmente pelo Governo de Itália. A continuada impunidade pelos crimes relacionados com as operações de detenções e transferências ilegais da CIA tem de acabar, tanto nos Estados Unidos como na Europa, onde dezenas de países – incluindo a Itália – ajudaram a CIA a levar a cabo este programa global criminoso”, prosseguiu a perita.

Na foto: ativistas da Amnistia Internacional numa ação de rua, em Oslo, contra as detenções e transferências secretas do programa da CIA

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