8 Julho 2014

O número de crianças não acompanhadas que atravessam a fronteira do México com os Estados Unidos disparou para quase 50 mil, esperando-se uma subida ainda maior este ano – para o que a Amnistia Internacional insta a Administração norte-americana a adotar medidas imediatas de resolução desta crise humanitária e a assegurar que os direitos dos menores migrantes são garantidos.

Muitas destas crianças fogem de cenários de crime organizado e de violência de gangues, de situações de extrema insegurança e pobreza nos países de origem, onde se incluem as Honduras, Guatemala, Nicarágua, México e El Salvador. Os níveis sem precedentes de violência de gangues e do crime organizado no México e em muitos países da América Central estão a forçar milhares de menores não acompanhados a deslocarem-se para os Estados Unidos, enfrentando viagens profundamente desgastantes e perigosas.

A maioria ruma como clandestinos no topo de comboios de carga e acaba por enfrentar realidades de discriminação e xenofobia, são alvos de traficantes de droga e de tráfico humano, presas muito vulneráveis a rapto e de gangues criminosos – muitas vezes em conluio com funcionários governamentais.

Todos os anos, milhares de migrantes são vítima de abusos, raptos e violação. Todos os migrantes arriscam estes abusos brutais, mas as mulheres e crianças – e em especial os menores não acompanhados – estão numa situação de particular vulnerabilidade. E aqueles que cometem estes abusos contra migrantes só muito raramente são responsabilizados perante a justiça.

Detenções irregulares à chegada aos Estados Unidos

À chegada aos Estados Unidos, crianças não acompanhadas são detidas pelos serviços de fronteira norte-americanos e entregues à Agência de Realojamento de Refugiados (ORR), organismo dependente do Departamento de Serviços de Saúde, enquanto decorrem os procedimentos de deportação para os países de origem. Desde outubro de 2013, o número de crianças postas sob custódia da ORR já ultrapassou as 52.193 – quase o dobro dos menores detidos pelos serviços de fronteira no mesmo número de meses em 2013 prévios a outubro.

As estimativas da Administração norte-americana indicam que o número de menores não acompanhados detidos na passagem de fronteiras em estados como o Texas, Arizona e Califórnia deverá ultrapassar 90 mil já no final de setembro. As idades chegam a ser tão jovens como os cinco anos.

E testemunhos recentes revelam que a guarda fronteiriça está deter menores oriundos da América Central e a mantê-los sob sua tutela vários dias ou mesmo semanas antes de os transferir para a ORR.

Apesar de estas crianças irem enfrentar um ambiente de elevado risco quando são repatriadas, os menores não acompanhados oriundos do México são prontamente levados de volta através da fronteira a um ritmo muito mais acelerado do que acontece com as que são de outros países. Além disto, os menores mexicanos sofrem o risco acrescido de raptos, morte e violação às mãos dos gangues das cidades de fronteira do México.

Ao abrigo da lei internacional, os Estados Unidos estão obrigados a asseverar que os direitos humanos das crianças migrantes não acompanhadas são respeitados, protegidos e cumpridos na íntegra. A legislação internacional determina que estes menores apenas podem ser detidos em circunstâncias especiais e pelos mais curtos períodos de tempo possíveis. Além destes requisitos, nas circunstâncias extremamente limitadas em que é possível deter menores migrantes não acompanhados, as condições dessa detenção têm de estar de acordo com os padrões norte-americanos e internacionais de detenção.

As salvaguardas de tratamento justo perante a lei nos procedimentos de deportação têm de estar garantidas a todas as crianças, incluindo o acesso imediato a aconselhamento, serviços de tradução e intérprete e o direito de não ser devolvido a um país onde o menor fique em risco de graves violações de direitos humanos. Tal traduz-se em garantir que os governos regionais adotam e põem em prática de forma eficiente medidas de proteção do interesse da criança não acompanhada que seja repatriada.

Admnistração norte-americana tem de adotar medidas de proteção dos menores migrantes

O Presidente norte-americano, Barak Obama, pediu esta semana ao Congresso que aprove um financiamento de mais de dois mil milhões de dólares para controlar esta vaga de menores não acompanhados nas fronteiras assim como o poder para tornar as deportações mais expeditas.

As crianças que fogem de níveis de crime organizado e violência de gangues sem precedentes não são peões no debate político sobre a reforma política da imigração. Muitas são sobreviventes de violência sexual e estão em risco de rapto, de tráfico e outras graves violações de direitos humanos.

O diretor-executivo da Amnistia Internacional Estados Unidos, Steven Hawkins, defende que a Administração norte-americana “não deve agravar o sofrimento destas crianças apressando-se a retirá-las do país”, antes “a resposta das autoridades a esta crise tem de ser abrangente”. “Os Estados Unidos têm de adotar medidas para garantir que os direitos destes menores são respeitados de acordo com as obrigações do país ao abrigo da legislação internacional”, reitera.

Essas medidas passam por:

  • assegurar que as crianças migrantes não acompanhadas jamais são detidas em centros de imigração;
  • garantir que todas as crianças migrantes não acompanhadas recebem cuidados adequados e têm acesso à educação, a serviços de saúde e outros essenciais;
  • asseverar que as crianças que podem ser sobreviventes de violência sexual recebem cuidados médicos e psicológicos apropriados;
  • fazer respeitar na íntegra as salvaguardas legais dos procedimentos de deportação, incluindo o acesso imediato a aconselhamento, serviços de tradução e intérpretes e à nomeação de guardiães encarregues de representar os seus interesses;
  • não devolver nenhuma criança a um país onde o menor fique em risco de graves violações de direitos humanos.

Além daquelas medidas cruciais, a Amnistia Internacional sustenta que os Estados Unidos devem também redobrar os esforços no trabalho desenvolvido com os outros governos da região para melhorar a segurança e a proteção dos direitos humanos, o que inclui:

  • coordenar medidas de cumprimento das obrigações de direitos humanos no combate aos gangues criminais que cometem abusos contra os migrantes;
  • divulgar de forma generalizada, e em cooperação com a sociedade civil, informação acessível às comunidades onde é passível ocorrerem fluxos de imigração irregular, em especial junto das mulheres e crianças – sendo que esta informação deve explicar os direitos dos migrantes, expor os padrões de abuso que visam os migrantes, fornecer números de telefone de serviços de assistência e detalhar os procedimentos para apresentar queixas e aceder aos serviços consulares.

 

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