1 Fevereiro 2016

A reintegração no Exército nigeriano de um general envolvido no assassinato de centenas de detidos sublinha o falhanço monumental do Governo do país em pôr fim à impunidade dos crimes de guerra cometidos pelas mais altas patentes e autoridades, avalia a Amnistia Internacional.

O major-general Ahmadu Mohammed foi identificado em junho passado no relatório da Amnistia Internacional “Stars on their shoulders. Blood on their hands” – junto com outros oito altas patentes militares da Nigéria –, tendo a organização de direitos humanos instado desde aí para que fosse feita uma investigação à sua possível responsabilidade criminal por crimes de guerra, incluindo as mortes de mais de oito mil detidos.

Aquele major-general comandava a 7ª Divisão e liderava as operações durante as quais os militares executaram mais de 640 detidos, depois de um ataque do grupo armado islamita Boko Haram ao centro de detenção do quartel de Giwa, em Maiduguri, a 14 de março de 2014. Ahmadu Mohammed foi afastado de funções ainda naquele ano por razões não relacionadas com o incidente, mas acabou por ser reintegrado recentemente.

O detalhado relatório da Amnistia Internacional expôs uma série de crimes de guerra e possíveis crimes contra a humanidade cometidos pelos militares no decurso das operações contra o Boko Haram. Essa investigação documentou que, desde março de 2011, mais de sete mil pessoas foram sujeitas a fome, sufocadas e torturadas até à morte em campos de detenção militares na Nigéria. E mais 1 200 foram executadas sumariamente.

“O major-general Ahmadu Mohammed tem de ser investigado pela sua participação, autorização ou por ter falhado em evitar as mortes de centenas de pessoas”, exorta o secretário-geral da Amnistia Internacional, Salil Shetty. “Homens jovens e rapazes, apanhados pelos militares, foram alvejados, submetidos a fome, sufocados ou torturados até à morte e ninguém foi até à data responsabilizado. É inaceitável que o major-general Mohammed possa voltar ao comando das tropas antes de sequer ter sido iniciada uma investigação”.

“Stars on their shoulders. Blood on their hands” assenta em vários anos de investigação e análise de provas – incluindo relatórios e correspondência militar, assim como entrevistas a mais de 400 vítimas, testemunhas e altas patentes das forças de segurança nigerianas. Nele são documentados crimes de guerra e possíveis crimes contra a humanidade cometidos pelos militares nas operações contra o Boko Haram.

Horas apenas após a publicação daquele relatório, a 3 de junho passado, o Presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, respondeu através da sua conta de Twitter: “Garanto-vos que o vosso relatório será analisado” e “Esta Administração não deixará pedra sobre pedra na promoção do Estado de direito e na resolução de todos os casos de abusos de direitos humanos”, prometeu.

Pouco mais de uma semana depois, o Presidente anunciou que a investigação à responsabilidade criminal nas violações de direitos humanos documentadas no relatório da Amnistia Internacional seria a primeira tarefa do Procurador-geral. Essa investigação ainda não foi iniciada.

Desde a publicação do relatório “Stars on their shoulders. Blood on their hands”, quatro dos comandantes militares nele identificados reformaram-se. Outros dois já se tinham retirado antes mesmo da data de publicação do relatório. É desconhecido o estatuto atual de dois brigadeiros-generais também nomeados na investigação. O major-general Ahmadu Mohammed foi afastado do cargo a 16 de maio de 2014, dois dias após ter ocorrido um motim dos militares sob o seu comando. A Amnistia Internacional tomou conhecido de que fora reintegrado nas forças militares nigerianas a 17 de janeiro passado.

“Sete meses depois da publicação das horríveis descobertas e do compromisso feito pelo Presidente de que as mesmas seriam analisadas, continuamos a instar que sejam lançadas investigações independentes e urgentes”, nota Salil Shetty. “Aqueles que são responsáveis pelos crimes documentados no relatório da Amnistia Internacional têm de ser levados à justiça, independentemente da sua patente ou cargo. Só assim pode ser feita justiça por aqueles que morreram e pelos seus familiares”, remata o secretário-geral da organização de direitos humanos”.

 

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