6 Março 2014

É uma questão de saúde que afeta a vida de milhões de pessoas por todo o mundo, as quais estão em risco, penalizadas por falhanços redondos de políticas governamentais em assegurar-lhe o gozo pleno dos direitos de saúde sexual e reprodutiva. O quadro é negro e não é exclusivo de nenhuma parte do mundo em especial, sustenta a Amnistia Internacional no lançamento oficial da campanha global O Meu Corpo, os Meus Direitos.

“É inacreditável que no século 21 alguns países continuem a dar aval ao casamento de crianças e à violação dentro do casamento, e que noutros o aborto, as práticas sexuais fora do casamento e as relações sexuais entre pessoas do mesmo género sejam ilegais, criminalizadas até com a pena de morte”, sublinha o secretário-geral da Amnistia Internacional, Salil Shetty. “Os estados têm de agir pró-ativamente, não apenas eliminando leis repressivas mas também promovendo e protegendo os direitos de saúde sexual e reprodutiva, disponibilizando informação, educação, serviços e pondo fim à impunidade da violência sexual”, prossegue.

A nova campanha da Amnistia Internacional – O Meu Corpo, os Meus Direitos –, que abre oficialmente esta quinta-feira, 6 de março e decorrerá ao longo dos próximos dois anos, é sobre as pessoas terem o poder de gozar em plenitude a sua sexualidade.

Investigações e dados estatísticos coligidos pela organização mostram a existência de uma crescente repressão dos direitos sexuais e reprodutivos em muitos países pelo mundo onde é dada prioridade a políticas opressivas sobre as liberdades e garantias fundamentais e os direitos humanos. Tudo isto sinaliza um futuro muito perigoso para a próxima geração, caso o mundo continue a desviar o olhar a esta repressão dos direitos sexuais e repressivos. Os números são chocantes.

São 150 milhões de raparigas com menos de 18 anos que atualmente já sofreram um abuso de natureza sexual. São 142 milhões as que estão em risco de casarem ainda crianças entre 2011 e 2020. São 14 milhões, as raparigas que têm um filho todos os anos, a maior parte em resultado de sexo sob coação ou uma gravidez indesejada. Mais de 215 milhões de mulheres não têm acesso à contraceção, apesar de desejarem não ter ou adiar uma gravidez. E são pelo menos 76 os países em que a prática sexual entre pessoas do mesmo sexo é ilegal e criminalizada – 36 deles em África.

A campanha O Meu Corpo, os Meus Direitos encoraja os jovens de todo o mundo a conhecerem e exigirem o exercício do seu direito a tomarem as suas decisões sobre a sua saúde, o seu corpo, a sua sexualidade e a sua reprodução, sem controlo do Estado, nem medo, nem coerção ou discriminação. A campanha visa também lembrar aos líderes mundiais as suas obrigações em adotarem uma atitude pró-ativa, incluindo a disponibilização de serviços de saúde na área dos direitos sexuais e reprodutivos.

Dois anos de campanha intensa

O secretário-geral da Amnistia Internacional assinalou o lançamento desta campanha global com visitas a comunidades rurais no Nepal, onde muitas raparigas são obrigadas a casar ainda em crianças e mais de meio milhão de mulheres sofrem de prolapso uterino (ou útero descaído), uma condição profundamente debilitante que resulta de gravidezes sucessivas combinadas com trabalho físico muito desgastante. Khumeni é uma dessas mulheres: casou aos 15 anos por pressão dos pais e teve dez gravidezes seguidas, durante as quais era forçada a carregar pesos enormes, muitas vezes não lhe sendo permitido mais do que uma semana após o parto para descansar – sofreu de prolapso uterino durante oito anos até finalmente conseguir aceder a tratamento cirúrgico.

Nestes dois anos da campanha O Meu Corpo, os Meus Direitos, a Amnistia Internacional vai publicar uma série de relatórios sobre vários países onde os direitos sexuais e reprodutivos são negados. Aqui se incluem investigações aos casos em que raparigas no Magreb são obrigadas a casar com os homens que as violaram; aos casos em que mulheres e raparigas, em El Salvador, na Irlanda e noutros países, vêm ser-lhes negado o aborto apesar de a gravidez lhes comportar um risco de saúde ou mesmo de vida; aos casos no Burkina Faso em que raparigas são obrigadas a ter filhos quando elas próprias são ainda crianças.

A Amnistia Internacional entende que todas as pessoas devem ser livres para tomarem as suas decisões sobre se querem ter sexo, quando e com quem, se e quando casar ou ter filhos e como melhor se protegerem de doenças sexualmente transmitidas e do Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH).

“Com a campanha O Meu Corpo, os Meus Direitos, a Amnistia Internacional quer ajudar a nova geração a compreender e a assumir o controlo dos seus direitos sexuais e reprodutivos. Juntos queremos passar aos governos a mensagem clara e inequívoca de que uma regulação invasiva por parte do Estado constitui uma violação dos direitos humanos e é inaceitável”, frisa Salil Shetty.

 

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