25 Outubro 2024

 

  • O dissidente político Félix Navarro, a jornalista independente e “dama de blanco” Sayli Navarro, o manifestante do 11 de julho de 2021 Roberto Pérez Fonseca e o ativista Luis Robles foram declarados prisioneiros de consciência.
  • “Estas designações são um reconhecimento das dezenas de pessoas que permanecem na prisão em Cuba por exercerem pacificamente os seus direitos, e de todos aqueles que vivem sob constante vigilância, assédio e ameaça de criminalização” — Ana Piquer, diretora da Amnistia Internacional para as Américas.
  • A Amnistia Internacional apela à libertação imediata e incondicional dos presos de consciência e de todas as pessoas injustamente detidas apenas por exercerem os seus direitos humanos.

 

Num contexto de violações sistemáticas dos direitos humanos, de restrição total do espaço cívico e de criminalização de qualquer forma de dissidência, a Amnistia Internacional declarou como prisioneiros de consciência o dissidente político Félix Navarro, a jornalista independente e “dama de blanco” Sayli Navarro, o manifestante do 11 de julho de 2021 Roberto Pérez Fonseca e o ativista Luis Robles.

“Estas designações são um reconhecimento das dezenas de pessoas que permanecem na prisão em Cuba por exercerem pacificamente os seus direitos, e de todos aqueles que vivem sob constante vigilância, assédio e ameaça de criminalização. Um reconhecimento da coragem e da resistência do povo de Cuba que enfrenta a repressão constante e generalizada e luta pelos seus direitos e pelos direitos de todas as pessoas”, disse Ana Piquer, diretora da Amnistia Internacional para as Américas.

“Estas designações são um reconhecimento das dezenas de pessoas que permanecem na prisão em Cuba por exercerem pacificamente os seus direitos, e de todos aqueles que vivem sob constante vigilância, assédio e ameaça de criminalização”

Ana Piquer

Félix Navarro é um dissidente político de 71 anos e fundador do Partido para a Democracia “Pedro Luis Boitel”. Durante mais de 30 anos foi coordenador da União Patriótica de Cuba e esteve associado à plataforma Cuba Decide e ao Conselho para a Transição Democrática em Cuba. Félix cumpre atualmente a sua terceira pena de prisão por motivos políticos. Em 1992 foi preso sob a acusação de “propaganda inimiga” por ter afixado cartazes “antirrevolução” na sua cidade natal. Em 2003 foi condenado a 25 anos de prisão no âmbito do processo penal que se seguiu à repressão conhecida como “Primavera Negra”, em conjunto com 75 outros dissidentes, jornalistas e ativistas, sendo, neste contexto, declarado prisioneiro de consciência pela Amnistia Internacional. Foi libertado em licença extrapenal em 23 de março de 2011,  — ao mesmo tempo que o também prisioneiro de consciência José Daniel Ferrer — tendo sido o último do grupo de 75 a ser libertado, depois de anteriormente se ter recusado a ser libertado em troca de exílio.

Sayli Navarro, filha de Félix, é uma ativista de 38 anos e cofundadora das Damas de Blanco (Damas de Branco), um grupo de mães, esposas e filhas do grupo de 75 pessoas detidas durante a “Primavera Negra”. Desde criança que Sayli vive com as consequências da repressão estatal exercida contra o pai. Expulsa da universidade em 2010 devido às suas “ligações contrarrevolucionárias”, foi detida arbitrariamente, submetida a interrogatórios e ameaçada em várias ocasiões por agentes de segurança do Estado e autoridades policiais.

Félix e Sayli Navarro foram condenados em março de 2022 a nove e oito anos de prisão, respetivamente, por factos relacionados com os protestos de 11 e 12 de julho de 2021. Ambos foram violentamente detidos em 12 de julho na esquadra de polícia local, na cidade de Perico, província de Matanzas, quando se informavam sobre a situação de membros do seu movimento detidos durante os protestos do dia anterior.

© Julio LLopiz-Casal / Amnesty International

Luis Robles, de 32 anos, foi condenado a quatro anos e seis meses de prisão em março de 2022 sob a acusação de propaganda inimiga e desobediência por protestar pacificamente numa rua pedonal no centro de Havana em dezembro de 2020. Luis segurava um cartaz onde se lia “Liberdade”, “Não+Repressão” e “#Free-Denis” e caminhava em círculos enquanto dezenas de pessoas começavam a filmá-lo. Luis Robles manteve o cartaz durante vários minutos, até que a polícia se aproximou, tirou-lhe o cartaz e prendeu-o, sem que Luis opusesse qualquer resistência. Isto aconteceu alguns dias depois de o Movimento San Isidro ter realizado um confinamento e uma greve de fome para exigir a libertação do rapper Denis Solís. Luis quis expressar a sua solidariedade para com o rapper e o seu apoio ao Movimento San Isidro.

Roberto Pérez Fonseca, 41 anos, foi condenado em outubro de 2021 a dez anos de prisão pela sua participação nos protestos de 11 de julho de 2021. Roberto foi acusado dos crimes de desacato, agressão, desordem pública e incitamento à prática de um crime, todos eles tipicamente utilizados pelas autoridades cubanas contra aqueles que exercem o seu direito à liberdade de reunião e associação pacíficas. O Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Detenção Arbitrária considerou que a detenção de Roberto foi arbitrária e motivada pelo exercício pacífico do seu direito à liberdade de reunião e associação, bem como à liberdade de opinião e expressão. Considerou também que o direito de Roberto a um julgamento justo e imparcial tinha sido violado.

 

Contexto de uma nova onda de repressão

Estas designações surgem no contexto de uma nova repressão por parte das autoridades cubanas contra ativistas, defensores dos direitos humanos, jornalistas, intelectuais e meios de comunicação social independentes nas últimas semanas de setembro. Esta repressão inclui um aumento alarmante de maus-tratos, assédio, detenções arbitrárias, novas ameaças de criminalização, negação de benefícios prisionais e relatos preocupantes de deterioração da saúde e da integridade física dos detidos.

“O Estado cubano parece empenhado em erradicar qualquer capacidade de resistência na sociedade cubana, que agora se estende a projetos, espaços e ativismo não ligados à oposição ou dissidência política tradicional”

Ana Piquer

“Na sequência da repressão estatal generalizada desencadeada pelos protestos de julho de 2021, e com muitos ativistas, opositores políticos e dissidentes injustamente presos, o Estado cubano parece empenhado em erradicar qualquer capacidade de resistência na sociedade cubana, que agora se estende a projetos, espaços e ativismo não ligados à oposição ou dissidência política tradicional”, acrescentou Ana Piquer.

Os meios de comunicação independentes El ToquePeriodismo de Barrio e Cubanet afirmaram em editoriais e nas redes sociais que os seus colaboradores receberam ameaças de criminalização por parte das autoridades nas últimas semanas. De acordo com esses relatos, os colaboradores foram repetidamente convocados pela polícia e por agentes de segurança do Estado e informados de possíveis processos criminais por “mercenarismo”. Além disso, ativistas e colaboradores de meios de comunicação social independentes relataram nas suas redes sociais terem recebido citações arbitrárias seguidas de interrogatórios pelas autoridades e agentes de segurança do Estado sobre o seu trabalho jornalístico e as suas ligações a determinados indivíduos ou meios de comunicação social considerados “contrarrevolucionários”.

Neste contexto, a Amnistia Internacional teve acesso aos testemunhos de pelo menos 20 ativistas, que denunciaram ter sido ameaçados de prisão, obrigados a gravar-se a si próprios e a assinar declarações de autoincriminação, e privados dos seus telemóveis e computadores. Do mesmo modo, as organizações cubanas de defesa dos direitos humanos informaram que pelo menos três colaboradores de meios de comunicação social independentes foram forçados a escrever demissões públicas nas suas redes sociais, manifestando a sua intenção de não trabalhar com meios de comunicação social independentes. Em 16 de setembro, a revista cultural AMPM Magazine anunciou o seu encerramento definitivo devido à crescente pressão e perseguição contra o seu diretor por parte dos agentes de segurança do Estado.

“Este clima de medo e intimidação constantes vem juntar-se à nossa preocupação com as contínuas informações sobre a deterioração do estado de saúde e os maus-tratos infligidos aos prisioneiros de consciência Loreto Hernández, Pedro Albert e José Daniel Ferrer, bem como com a perseguição crescente e sistemática do jornalista Carlos Michael Morales e da dirigente das Damas de Blanco, Berta Soler. É imperativo que a comunidade internacional se mostre solidária e exija a libertação imediata das pessoas presas por exercerem os seus direitos, bem como o fim da repressão e do assédio aos dissidentes em Cuba”, afirmou Ana Piquer.

A Amnistia Internacional apela à libertação imediata e incondicional dos presos de consciência e de todas as pessoas injustamente detidas apenas por exercerem os seus direitos humanos. A organização apela também ao governo de Miguel Díaz-Canel para que respeite os direitos humanos, incluindo o direito à liberdade de expressão, de associação e de reunião pacífica, para que revogue a legislação repressiva e para que acabe com a repressão dos dissidentes.

Para determinar se uma pessoa é um prisioneiro de consciência, a Amnistia Internacional utiliza a informação disponível sobre as circunstâncias que levaram à sua detenção. Ao designar uma determinada pessoa como prisioneiro de consciência, a Amnistia Internacional está a afirmar que essa pessoa deve ser imediata e incondicionalmente libertada, mas não está a endossar as suas opiniões ou condutas passadas ou presentes.

 

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