25 Agosto 2015

Centenas de pessoas foram condenadas à morte após julgamentos injustos na Arábia Saudita, onde o sistema de justiça apresenta graves falhas, revela a Amnistia Internacional numa investigação divulgada esta terça-feira, 25 de agosto.

Killing in the Name of Justice: The Death Penalty in Saudi Arabia” (“Executando em Nome da Justiça: a Pena de Morte na Arábia Saudita”) revela a chocante aplicação arbitrária da pena de morte naquele que continua a ser um dos três países que mais executa no mundo. A pena capital é muitas vezes imposta após julgamentos que desrespeitam de forma flagrante os padrões internacionais de um julgamento justo.

“A pena de morte é deplorável em qualquer circunstância, mas é particularmente deplorável quando é aplicada de forma arbitrária após julgamentos injustos”, acusa o diretor interino da Amnistia Internacional para a região do Médio Oriente e Norte de África, Said Boumedouha. “O que facilita as condenações à morte em grande escala é o sistema de justiça cheio de falhas existente no país”, continua.

Baseado na lei Sharia  [lei islâmica], o sistema de justiça saudita não tem um código penal, o que permite que as definições dos crimes e das suas punições sejam vagas e amplamente abertas a interpretações. O sistema dá aos juízes poder discricionário nas suas deliberações, o que origina grandes discrepâncias e, por vezes, decisões arbitrárias. “As autoridades estão a brincar com a vida das pessoas de uma forma imprudente e chocante”, acusa o especialista da Amnistia Internacional.

 

7 factos chocantes sobre a pena de morte no país

1)    Em média, a Arábia Saudita executa uma pessoa a cada dois dias. Pelo menos 102 pessoas foram executadas nos primeiros seis meses deste ano, comparadas com as 90 executadas em todo o ano de 2014. Pelo menos 2.208 pessoas foram executadas no país entre janeiro de 1985 e junho de 2015.

2)    A condenação à morte surge, muitas vezes, após julgamentos injustos e sumários, que não respeitam os padrões internacionais: é frequente os réus não terem acesso a um advogado, há julgamentos que decorrem em segredo e condenações baseadas em “confissões” obtidas sob tortura ou outros maus-tratos. Também é frequente ser negado aos condenados o direito a um recurso apropriado.

3)    Há crimes puníveis com as chamadas tai’zir [penas discricionárias] em que a simples suspeita pode ser suficiente para um juiz decretar a pena de morte (tendo por base a gravidade do crime ou as características do criminoso). 

4)    Um terço das pessoas executadas desde 1985 foram condenadas à morte por crimes que não se enquadram nos internacionalmente considerados “crimes mais graves” (em relação aos quais a pena de morte é admissível nos termos da legislação internacional). Uma boa percentagem dos executados foram condenados por crimes relacionados com a droga. No país são ainda puníveis com pena capital crimes não-letais como o “adultério”, assalto à mão armada, “apostasia”, violação, “feitiçaria” e “bruxaria”.

5)    Cerca de metade dos que foram executados no país desde 1985 – 48,5% (1.072 pessoas) – eram cidadãos estrangeiros, quando estes representam 33% da população saudita. A muitos foi negado um serviço adequado de tradução durante o julgamento e foram forçados a assinar documentos – incluindo confissões – que não compreendiam.

6)    A Arábia Saudita executa normalmente por enforcamento ou, em alguns casos, recorrendo a um pelotão de fuzilamento. Por vezes as execuções decorrem em público e os corpos e as cabeças dos executados são colocados em exposição.

7)    É frequente os familiares dos prisioneiros no corredor da morte não serem notificados da data da execução. Alguns sabem da execução pelos meios de comunicação social.

 

Amnistia Internacional apela a uma moratória às execuções

A Arábia Saudita continua a negar todas as críticas feitas à sua aplicação da pena de morte, argumentando que as sentenças são aplicadas segundo a lei islâmica Sharia e que a pena capital só é usada para os “crimes mais graves” e seguindo os mais rigorosos padrões de julgamento justo. Said Boumedouha acrescenta que tal não podia estar “mais longe da verdade”.

“Ao invés de defenderem o terrível historial do país [no que diz respeito à pena de morte], as autoridades da Arábia Saudita deviam, com urgência, estabelecer uma moratória oficial sobre as execuções e implementar os padrões internacionais de julgamentos justos em todos os procedimentos criminais”, conclui o perito.

A Amnistia Internacional apela ainda às autoridades que, enquanto a pena capital não é abolida totalmente – e em conformidade com a lei e os padrões internacionais – , restrinjam a sua aplicação aos crimes que envolvem “assassinato intencional”, deixem de a usar em crimes cometidos quando os réus ainda eram menores de idade e que a pena de morte nunca seja imposta a pessoas que sofrem de perturbações mentais.

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