10 Março 2015

Ao fim de 46 anos no corredor da morte à espera da execução, o japonês Hakamada Iwao voltou a casa, muito graças à irmã, Hideko, e a centenas de milhares de pessoas em todo o mundo que se mobilizaram em seu apoio. Hakamada Iwao teve do seu lado também apoiantes célebres, como o actor Jeremy Irons, que criticaram a injustiça da sua condenação à morte. Esta terça-feira, 10 de março, é o primeiro aniversário em quase cinco décadas que celebra em liberdade.

Hakamada Iwao sofreu ao longo de mais de 40 anos no corredor da morte de uma prisão no Japão sem saber se cada dia em que acordava seria o seu último. Esse último dia no corredor da morte acabou por chegar a 27 de março de 2014, não para o fazer caminhar para a execução – antes para a liberdade, permitindo-lhe regressar a casa ao fim de 48 anos preso, 46 deles no corredor da morte.

A libertação de Hakamada Iwao, ainda que em regime de liberdade condicional, constitui uma vitória para ele e para as centenas de milhares de pessoas que o defenderam. E apesar de o mais notório apoio lhe ter chegado de celebridades mundiais, nem mesmo estes saberiam do que se passava com ele se não fosse uma mulher: a sua irmã, Hideko.

Pugilista profissional, Hakamada Iwao foi acusado de homicídio e detido em 1966 – logo desde esse momento Hideko acreditou na sua inocência. “Estive sozinha e isolada durante os primeiros dez anos, sem nenhum apoio. Tinha vergonha. Não podia sequer dizer abertamente que o meu irmão era inocente”, recorda Hideko.

Dois anos após a detenção, sob ameaças e maus-tratos, Hakamada Iwao “confessou” e foi condenado à morte. Os órgãos de comunicação social japoneses retrataram-no como um criminoso violento por ser pugilista. Ainda assim, a irmã não se deu por vencida e pouco a pouco foi juntando apoios.

O arranque das campanhas

Uma das pessoas que se juntou à defesa de Hakamada Iwao foi Yamazaki Toshiki, que teve conhecimento do caso em novembro de 1981. Em poucos meses estava a formar um grupo de apoio em Shimizu, a cidade em que Hakamada Iwao fora detido.

“Conheci Hideko assim que me envolvi na sua causa. A sua força física e mental espantou-me desde esse primeiro momento. A fé que ela tinha nele podia mudar tudo. E eu fui capaz de continuar a levar a cabo ações de campanha em defesa de Hakamada Iwao por causa dela”, recorda.

Yamazaki Toshiki foi uma das poucas pessoas autorizadas a visitar Hakamada na prisão, depois de lhe ser confirmada em instância superior a sentença de morte em 1980. Mas conforme a saúde mental do antigo pugilista se deteriorava, ele mesmo começou a recusar receber visitas, incluindo a própria irmã.

“Mesmo assim continuei a ir à prisão para lhe dizer: ‘não estás sozinho e são muitas as pessoas que te apoiam fora daqui’. Também lhe enviava postais e fotografias e artigos dos jornais relacionados com o caso dele”, prossegue Yamazaki Toshiki.

Só mais tarde a ativista descobriu que não era permitido a Hakamada Iwao receber correspondência na prisão. “Indigna-me que estas regras sejam tão rígidas e não seja autorizado que as pessoas condenadas à morte recebam cartas”, critica.

A solidariedade espalha-se por todo o mundo

Ao ser libertado, Hakamada Iwao saiu da prisão com sete caixas cheias de cartas, muitas delas escritas por ativistas e apoiantes da Amnistia Internacional. Essas cartas são o resultado de anos de campanhas e ações de solidariedade.

“Todos os dias chegavam à prisão mensagens vindas do mundo inteiro”, relata o diretor da Amnistia Internacional Japão, Wakabayashi Hideki, que conduziu a campanha da organização de direitos humanos em defesa do antigo pugilista.

A partir da década de 1980, alguns membros da Amnistia Internacional engrossaram estes esforços de campanha. Foi o caso de Hans Erdt, da Alemanha, que soube da história de Hakamada Iwao em 1999 e escreveu “muitas mensagens, petições” e deu “visibilidade ao caso” durante muitos anos.

Uma vitória parcial

Quando Hakamada Iwao foi libertado a aguardar novo julgamento em março, apoiantes do mundo inteiro celebraram este desenvolvimento. “Mas essa alegria foi diminuída com a notícia de que os procuradores tinham recorrido daquela decisão do Tribunal distrital”, explica o britânico Gill, da Amnistia Internacional Reino Unido. “Apesar de [Hakamada] estar em liberdade, entristece-me muito que nada possa compensar tantos anos na prisão a viver sob a ameaça de execução”, afirma o ativista.

Todos os anos passados na prisão – e muitos deles em regime de solitária – deterioraram a saúde mental de Hakamada Iwao. “Ele crê que ganhou o caso finalmente e não voltará à prisão”, adianta Hideko. “Agora anda sempre de um lado para o outro em casa e depois descansa um pouco, como quando estava preso. Não vê televisão, nem lê os jornais. Acho que vai demorar muito tempo até ele recuperar”, prossegue.

Paciência e compreensão são os traços que caracterizaram o ativismo de Hikedo em defesa do irmão. Aos 81 anos, esta mulher, que dedicou a vida a conquistar a liberdade de Hakamada, aceita que o irmão já não a reconheça.

Apesar de tudo isso, os laços afetivos permanecem intactos. “Nos últimos 15 anos [de prisão de Hakamada] só o via, porque ele se recusava a receber visitas. Mas ele continua a ser o meu irmão, mesmo após os 48 anos de separação”.

 

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