4 Março 2015

Ameaças, violência física, detenções e penas de prisão a críticos do Governo tornaram-se numa marca do regime do Azerbaijão conforme o país se prepara para ser anfitrião dos primeiros Jogos Europeus, em junho próximo, alerta a Amnistia Internacional num novo relatório, divulgado a 100 dias da cerimónia de abertura do grande evento desportivo em Bacu.

Guilty of Defending Rights: Azerbaijan’s human rights defenders and activists behind bars” (Culpados de defender direitos: ativistas e defensores de direitos humanos atrás das grades no Azerbaijão), publicado esta quarta-feira, 4 de março, descreve a crescente perseguição de que são alvo neste país os críticos do Governo, detidos sob acusações forjadas, espancados e ameaçados e privados de acesso a advogados e a cuidados médicos urgentes.

“Não nos devemos deixar enganar pelo brilho e pompa do espetáculo que o Azerbaijão está a fazer para dar uma imagem limpa no palco internacional e atrair o investimento estrangeiro. As autoridades do Azerbaijão são das mais repressivas da Europa e estariam seguramente no pódio se fossem atribuídas medalhas pelo número de ativistas e defensores de direitos humanos que estão atrás das grades”, avalia o diretor da Amnistia Internacional para a região da Europa e Ásia Central, John Dalhuisen.

Pelo menos 22 prisioneiros de consciência permanecem nas prisões do Azerbaijão a aguardar julgamentos gerados por acusações falsas que vão desde fraude a desfalque, até uso de drogas e mesmo traição.

Em junho de 2014, o Presidente do país, Ilham Aliev, declarou num discurso na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (APCE) que as liberdades de expressão e de reunião estavam garantidas no Azerbaijão.

Porém, destacados defensores de direitos humanos falam de uma realidade muito diferente, descrevendo mais de 90 casos de perseguição, intimidação, detenções arbitrárias e acusações politicamente motivadas contra ativistas, jornalistas e outros que ousam criticar o Governo do país. A resposta das autoridades é rápida: em apenas algumas semanas desde aquele momento na APCE, por exemplo, todos os que testemunharam perante o Conselho da Europa sobre a situação no Azerbaijão foram detidos, um a seguir ao outro.

“Estas últimas detenções paralisaram de facto a sociedade civil e fecharam a porta à liberdade de expressão – marcando o nível mais baixo do estado de direitos humanos no Azerbaijão desde a independência do país”, aponta John Dalhuisen.

A defensora de direitos humanos Leila Iunus, de 60 anos e uma das mais proeminentes vozes críticas do Governo do Azerbaijão, foi detida em julho de 2014, alguns dias depois de ter apelado a um boicote aos Jogos Europeus como sinal de reprovação do registo de direitos humanos no país.

Leila Iunus contou ao seu advogado que, numa ocasião, um guarda prisional a arrastou da cela em que se encontrava para uma sala vazia, onde foi atirada ao chão e pontapeada. Num outro momento, um grupo de homens fizeram gestos sexualmente ameaçadores para ela. Esta conceituada defensora de direitos humanos passou os últimos seis meses na prisão a aguardar julgamento, tendo-se agravado os seus problemas de saúde – sofre de diabetes e tem hepatite C – devido às condições adversas nas prisões.

Leila Iunus foi acusada de traição, negócios ilegais, evasão fiscal, abuso de autoridade, fraude e falsificação. Estas acusações forjadas e politicamente motivadas assentam em novos regulamentos postos em marcha pelo Governo para encerrar de forma totalmente arbitrária organizações não-governamentais e prender os seus líderes.

Repressão de jornalistas

As autoridades intensificaram a repressão sobre os jornalistas críticos ao Governo. A jornalista Khadija Islailova, com premiados trabalhos de investigação, foi detida a 5 de dezembro de 2014 numa muito implausível acusação de incitamento ao suicídio de um outro jornalista com quem trabalhara.

Khadija Islailova publicara uma lista de nomes de prisioneiros políticos no Azerbaijão e estava também a investigar alegações de ligações entre a família do Presidente e um projeto de construção extremamente lucrativo em curso em Bacu.

Antes recebera ameaças anónimas de que caso não parasse com os seus trabalhos de investigação jornalística seriam divulgadas publicamente fotografias íntimas suas, que se crê terem sido tiradas por agentes governamentais sob segredo em sua própria casa.

Acusações falsas de uso de drogas e de hooliganismo contra jovens ativistas

As autoridades têm também tomado como alvo jovens ativistas que ousam falar contra o Governo, acusando-os em ofensas relacionadas com o uso e posse de drogas ou de atos de hooliganismo. As argumentações apresentadas para justificar as acusações contra estes jovens são questionáveis e os interrogatórios que lhes foram feitos focaram-se nas suas opiniões políticas.

O conhecido blogger Faraj Karimov relatou ter sido espancado pela polícia para que admitisse ofensas relacionadas com drogas. Foi ameaçado de que se não assinasse uma “confissão” a polícia lhe “causaria problemas” aos pais, colocando armas escondidas em casa deles.

A violência é também comum durante a detenção. O ativista pró-democracia Orkhan Eiubzade, de 19 anos, foi brutalmente atacado por dois polícias enquanto cumpria uma pena administrativa de 20 dias por ter participado numa manifestação pacífica “não autorizada”. Orkhan Eiubzade relatou à Amnistia Internacional que a polícia o forçou a ficar deitado de bruços no chão, com as mãos algemadas atrás das costas, tendo sido despido até ficar nu, esmurrado e pontapeado e que ameaçaram violarem-no com uma garrafa.

Não foi feita nenhuma investigação a estas denúncias. Em vez disso, o ativista foi acusado de agressão a agentes da polícia e condenado a dois anos de prisão.

“A comunidade internacional, de olhos postos nos petrodólares do Azerbaijão, tem permanecido extraordinariamente silenciosa sobre as táticas repressivas do regime e as violações de direitos humanos. E isto é demonstrativo de falta de visão e presta um enorme mau serviço àqueles que definham atrás das grades”, critica o diretor da Amnistia Internacional para a região da Europa e Ásia Central.

A organização de direitos humanos insta as autoridades do Azerbaijão a libertarem imediatamente e de forma incondicional todos os prisioneiros de consciência, e a investigarem total e imparcialmente todas as denúncias de maus-tratos por agentes do Estado e outros.

A Amnistia Internacional urge ainda as autoridades do Azerbaijão a pararem todas as formas de ameaça e quaisquer acusações criminais sobre os cidadãos por estes exercerem os direitos de liberdade de expressão e de reunião.

 

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